O caso das Lojas Americanas S.A.

17 de março de 2023

2023 começou com o mercado financeiro abalado com o caso das Lojas Americanas S.A.

Com toda a certeza esse assunto que podemos qualificar como um caso rumoroso e para alguns até escandaloso, tem muitas vinculações com uma especialidade jurídica que é o direito penal econômico.

Breve resumo: o caso das Lojas Americanas S.A.

Por certo repercutiu em todo o Brasil e no exterior o fato ocorrido no início deste ano de 2023 que foi a divulgação de indícios sérios de irregularidades contábeis nas análises dos balanços das operações das Lojas Americanas S.A.

No momento em que a referida empresa é uma companhia de capital aberto, listada na Bolsa de Valores de São Paulo – BOVESPA (AMER3), e regulada pela Comissão de Valores Mobiliários – CVM o caso ganhou imensa publicidade.

Só para ilustrar, assim que os problemas foram noticiados ocorreram sérios e imediatos desdobramentos, como por exemplo, a renúncia do CEO da Companhia, Sergio Rial.

Referido profissional, de fato, é um executivo extremamente preparado e que havia sido recém nomeado para comandar esta gigante do varejo.

Ao se desligar Sergio Rial tornou público um texto sobre sua decisão de renunciar ao cargo

Fato que tornou ainda mais rumoroso o cenário envolvendo os fatos, já que havia assumido as funções no dia 02 de janeiro e renunciou no dia 11 do mesmo mês deste ano de 2023.

Quais são os indícios envolvendo o caso das Lojas Americanas S.A.

Assim que o principal executivo anunciou o seu desligamento da companhia que é uma gigante do varejo no Brasil, veio à público a possibilidade de terem ocorrido irregularidades nos balanços da empresa.

Só para ilustrar, essas irregularidades – segundo indícios que ainda estão sendo apurados, conforme veremos adiante – estariam vinculadas à maquiagem de valores na ordem anunciada num primeiro momento de 20 bilhões de reais.

De conformidade com outras fontes tornadas públicas por veículos de comunicação, essas irregularidades poderiam alcançar a expressiva cifra de 40 bilhões de reais.

Dessa forma, o assunto envolve vários cenários de compliance e de governança corporativa da Lojas Americanas S.A., em questões que atingem seus processos de auditoria, a responsabilidade dos conselheiros e os eventuais prejuízos aos acionistas.

Breve resumo das supostas insconsistências

Só para ilustrar as empresas de varejo adquirem seus estoques de mercadorias em larga escala de fornecedores.

Para obtenção de preços vantajosos, essas aquisições destes estoques são feitas de tal forma que possibilitem o mínimo de comprometimento do caixa da empressa compradora.

Em contrapartida o pagamento à vista, proporciona o ganho de descontos e outras vantagens como negociação de preços.

Como resultado, a compradora então, se vale de uma operação conhecida no mercado como risco sacado.

Dessa forma, a companhia se vale de créditos bancários pagos em parcelas para fazer frente ao pagamento dos fornecedores.

Assim sendo, quem fornece recebe à vista pelas mercadorias. E a compradora fica devendo ao(s) banco(s) que financiou(ram) a(s) compra(s).

Segundo os indícios do que se apurou até aqui e tornado público pela imprensa, é provável que esta operação tenha sido realizada pelas Lojas Americanas S.A., que no momento de realizar a escrituração contábil desses empréstimos bancários não fez o lançamento do débito e das despesas financeiras com o devido rigor.

Reflexos junto aos acionistas

Sem dúvida, se esses indícios se confirmarem, há sérias inconsistências nos balanços das Lojas Americanas S.A., posto que o passivo eventualmente existente, não é mais com os fornecedores – que como dito – estão pagos.

Por outro lado, o passivo existe e com ele encargos financeiros junto aos bancos.

Assim, em apurada síntese, o resultado operacional da companhia e seu patrimônio líquido são muito menores do que os expressos nos balanços publicados.

Só para ilustrar, uma vez apurados e comprovados esses fatos, a companhia passa a ter uma severa desvalorização patrimonial e nas suas operações e resultados econômicos.

Por isso, seja uma diferença de 20 bilhões, ou de 40 bilhões, serão os acionistas os maiores atingidos por um eventual rombo dessas proporções.

Sem dúvidas, esses prejudicados passam a ser titulares do direito de reivindicar junto aos órgãos competentes – que podem ser muitos (como por exemplo: empresas de auditoria, gestores e conselheiros negligentes, a própria companhia) – a reposição das suas perdas.

Por conseguinte, podem também, figurar como vítimas em eventuais ações de natureza penal, desde que fique configurado o dolo por um ou por um concurso de agentes que buscaram lesar os acionistas.

Reflexos aos órgãos de auditoria – CVM e BOVESPA

Uma vez que reste comprovado de modo inequívoco que houve dolo ou mesmo má-fé de um ou mais agentes responsáveis pela existência das inconsistências acima apontadas, estes poderão sofrer sérias consequências.

Por exemplo, poderão ter que responder patrimonialmente pelos danos causados a terceiros, no caso acionistas das Lojas Americanas S.A.

Por outro lado, estando evidenciada a existência de materialidade, autoria e tipicidade penal todos quantos contribuiram para uma eventual fraude contábil ou de auditoria poderão responder penalmente por suas ações e/ou omissões.

Seja como for, o tema em questão precisa ser extremamente bem analisado.

Será necessária a mensuração e valoração dos fatos e das provas que estão sendo apuradas em fase de inquérito polícial e por meio de outros remédios legais já tornados públicos.

Sob o mesmo ponto de vista, ainda que não fique configurado o dolo ou má-fé, havendo negligência, imprudência ou imperícia dos responsáveis pela elaboração e análise dos balanços, ainda assim, estes poderão responder civilmente na medida, frequência, amplitude e extensão das suas responsabilidades.

Evolução do caso Lojas Americanas S.A.

Com o fim de preservar a continuidade dos negócios, a Lojas Americanas S.A. requereu e teve autorizada o processamento da sua recuperação judicial.

De fato, também foram judicializadas várias outras demandas envolvendo vários atores que estão ligados aos fatos.

Isso tudo, sem prejuízo das investigações de ordem criminal e penal econômica, que por certo terão muitos desdobramentos nas próximas fases.

A pergunta que fica, sob o ponto de vista do direito penal econômico é a seguinte:

Os responsávies pelas eventuais inconsistências dos balanços têm defesa?

A resposta nesta fase é dificil de ser assertiva.

Se as inconsistências de fato existiram é possível e provável que os autores sejam identificados de forma inquestionável.

Se serão responsabilizados em sede de direito penal econômico ou não, vai depender da configuração inquestionável da existência do dolo.

Pois é o dolo a figura vinculada ao tipo penal que possa dar materialidade a eventual(ais) crime(s), cuja capitulação só será possível com a conclusão do inquérito e/ou da(s) respectiva(s) ação(ões) penal(nais).

Conclusão

Como resultado até aqui, é totalmente prematuro se cravar qualquer juízo de valor sobre o caso das Lojas Americanas S.A.

De tal sorte que é a evolução dos acontecimentos e da colheita das provas que vai definir os destinos do caso.

Não só da companhia, como dos acionistas, auditores, agentes fiscalizadores e demais eventuais envolvidos nas supostas inconsistências noticiadas nos balanços da empresa.

Assista ao vídeo onde você pode ter mais detalhes sobre o Caso das Lojas Americanas S.A.

Simone Custódio
Advogada Especialista em Direito Penal Econômico
simone@nkadvocacia.com.br

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