Responsabilidade por próteses de má qualidade

12 de dezembro de 2022

A responsabilidade por próteses de má qualidade não é assunto novo. 

Mas está presente no dia a dia dos operadores do Direito em todo o Brasil e assim também no mundo. 

Ademais a questão abrange várias interfaces destas próteses.

A saber, podem ser próteses ortopédicas ou de qualquer outra natureza, como por exemplo: próteses mamárias, próteses oculares, próteses odontológicas, próteses penianas etc.

Ao mesmo tempo, se incluem nesse rol, materiais implantáveis, como por exemplo telas de correção de hérnias, dentre tantos outros.

Próteses e o Código de Defesa do Consumidor

Só para ilustrar, no Brasil as relações de consumo são regidas pelo Código de Defesa do Consumidor – CDC.

Essa Lei (nº. 8.078, de 11/09/1990) tem por objetivo a proteção e a facilitação dos direitos dos destinatários finais de bens ou serviços, que são os consumidores.


Então o CDC prevê a Política Nacional das Relações de Consumo e define a responsabilidade por próteses de má qualidade

Quem fiscaliza a produção de próteses? 

Antes de mais nada, por intermédio desta Política, a Lei prevê que é do Estado, no caso os Governos (Federal, Estaduais e Municipais), a responsabilidade de garantir o respeito à saúde e segurança da população.

Certamente para que este atendimento seja satisfatório, na área de saúde, a Lei exige que a fabricação de todos os produtos e serviços utilizados em favor dos pacientes sejam industrializados e comercializados corretamente.

Ou seja, que estejam de acordo com padrões de qualidade, segurança, desempenho e durabilidade estabelecidos e aprovados por órgãos governamentais.

Assim, antes de colocar um produto no mercado, o fabricante e o fornecedor devem obter autorizações prévias para sua fabricação ou importação, distribuição, venda ou uso, que no caso das próteses humanas são um certificado de registro oficial.

Enfim, todos os produtos colocados no mercado, sejam de fabricação nacional ou importados, devem estar de acordo com as exigências e especificações técnicas previstas e exigidas por estes órgãos reguladores e fiscalizadores.

Estes órgãos são, por exemplo – dentre outros, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa e o Instituto Nacional de Metrologia Normalização e Qualidade Industrial – Inmetro.

Assim também a responsabilidade por próteses de má qualidade abrange os fabricantes de próteses feitas “sob medida” que devem observar as condições técnicas exigidas dos produtos que utilizam para a confecção destas próteses.

Responsabilidade de quem indica a prótese 

Com toda a certeza, quando um profissional médico, dentista ou estabelecimento prestador de serviços médico-hospitalar ou odontológico indica prótese ou implante, assume a responsabilidade de observar se o produto indicado atende aos requisitos legais que permitem sua utilização.

E, sobretudo, se o fornecedor, ou fabricante, possui a regularidade e os certificados expedidos pelos órgãos públicos competentes.

Assim sendo, é também do médico, do dentista e/ou do serviço de saúde a obrigação de verificação do produto, em relação a existência do certificado de garantia, registro, autorização, etc.

Dessa forma, caso não exista esta certificação, ou não exista certificado de garantia, descarte imediatamente o material, ou recuse o seu uso. 

Então, se você for médico, dentista ou responsável por um serviço de saúde, não indique próteses não certificadas. 

E se você for o paciente ou familiar, solicite a prova dessa certificação. 

Responsabilidade por serviço público e/ou privado?

De fato, este cuidado deve ser observado em todos os serviços de saúde, sejam públicos ou privados.

Caso o profissional da saúde, opte por utilização de próteses sem observar a sua regularidade e a correta certificação técnica de garantia necessária, assume junto ao consumidor, ou seja, junto ao paciente ou familiar, o risco de indenizar eventuais defeitos e eventuais danos que surgirem.

Do mesmo modo, estando os produtos devidamente certificados pelos órgãos estatais competentes, em caso de defeitos ou má qualidade, a responsabilidade, será do fabricante, ainda que possa ser debatida eventual responsabilidade solidária perante o consumidor.

Entes estatais – responsabilidade por próteses de má qualidade 

Entretanto, se mesmo após fiscalizados e certificados os produtos de fabricação nacional e/ou importados apresentarem defeitos decorrentes de falhas na certificação pela ANVISA, INMETRO ou qualquer outro órgão fiscalizador e regulador, o Estado pode e deve responder, juntamente com o fabricante e/ou importador, pelos danos causados ao consumidor. 

Neste caso, de acordo com a legislação consumerista, a responsabilidade do Estado decorre do fato de ter negligenciado no seu direito/dever de fiscalizar (vigiar).

Essa negligência pode ser tanto na fabricação, como a comercialização destes produtos, ao permitir que cheguem ao consumidor com defeitos que não deveriam ter.

Assim sendo, observa-se a obrigação de contínua fiscalização e controle por parte dos órgãos públicos competentes sobre os produtos desenvolvidos para área da saúde. 

Também os profissionais da saúde, aí compreendidos os médicos, administradores de clínicas e hospitais, públicos ou privados, tem o dever de fiscalizar a qualidade dos produtos que irão indicar e utilizar em seus pacientes.

Cadeia de fornecedores e a responsabilidade por próteses de má qualidade


Importante frisar, que o fabricante é o responsável originário pelos defeitos ou má-qualidade apresentada pelas próteses ou implantes que houver fabricado.

Mesmo nos casos em que o paciente buscar ressarcimento de danos decorrentes da utilização destes produtos junto ao médico, dentista ou serviço de saúde, em razão da solidariedade decorrente da cadeia de fornecimento.

Então, estes poderão, regressivamente, cobrar os prejuízos deste ressarcimento junto ao fabricante.

Entretanto, segundo a legislação consumerista, há o que se chama de cadeia de fornecimento.

Assim, em tese, a responsabilidade poderá se estender, a critério e escolha do consumidor, para todos quantos estiverem envolvidos não só na produção, mas também na comercialização e uso da prótese ou implante defeituoso. 

Ou seja, a responsabilidade por próteses de má qualidade poderá abranger todos os envolvidos que são solidariamente responsáveis pelo defeito do produto

A saber: fabricante, importador, distribuidor, hospital, clínica e mesmo a pessoa física do médico ou do dentista. 

Consentimento informado

É direito do consumidor ser informado sobre todas as características dos produtos que lhe forem indicados pelos profissionais da saúde, detalhadamente.

Em caso de próteses ou implantes com defeitos de fabricação ou de má qualidade, de acordo com cada situação, tem o consumidor o direito de ser indenizado por todos os danos que sofrer.

Então para isso, se for seu caso, busque orientação nos órgãos de defesa do consumidor, no Ministério Público ou junto de um serviço jurídico de sua confiança.

Mas, além da indenização existem outras medidas jurídicas que poderão ser tomadas.

Responsabilidade civil por danos causados por prótese com defeito

Sempre que um consumidor final receber o implante de uma prótese ou implante defeituosos e sofrer um dano de tal forma que tenha sua funcionalidade prejudicada, tem o paciente o direito a receber indenização.

O mesmo raciocínio vale para o caso de ser necessária uma reposição ou substituição da prótese ou implante.

Só para ilustrar, a simples necessidade de remoção ou troca da prótese já deve ser considerado um dano, como por exemplo é muito comum em casos de prótese mamária com defeitos.  

Desde que o paciente assim o deseje, pode acionar o judiciário para buscar de um, todos ou alguns dos integrantes da cadeia de fornecimento o ressarcimento pelas despesas para cobertura dos danos sofridos.

Aí abrangidos ressarcimentos ou custeios de tratamentos, indenização por danos morais, danos estéticos, danos materiais, danos emergentes, lucros cessantes, dentre outros.

Com efeito, neste cenário o dano será sempre presumível, e as indenizações aplicáveis, as mais amplas possíveis, observando-se sua amplitude, frequência e extensão. ´

Trata-se da teoria do risco criado ou da culpa presumida.

Ao consumidor/paciente, basta demonstrar que houve uma relação de consumo com a implantação da prótese e que esta, seja por qual motivo for, apresentou um defeito. 

Ou seja: apresentou uma inconformidade, uma deformidade, incorreção técnica, imperfeição, falha, avaria ou dano. 

Neste sentido traz-se o seguinte julgado do STJ: https://bit.ly/3PagCTZ

Responsabilidade Penal por danos causados por prótese com defeito

Do mesmo modo, se o uso da prótese defeituosa decorre de uma ação de má-fé de quaisquer dos integrantes da cadeia de fornecimento, esses também poderão responder a uma ação penal.

A prática de delitos considerados como crime, será verificada de acordo com cada situação. 

Seja como for, quanto maior for o grau de gravidade dos danos, maior a tendência de responsabilização dos autores de eventual prática delituosa.

Sempre por meio de apuração dos fatos para aferição da autoria, materialidade e tipicidade da conduta de cada um dos envolvido. 

Titular do direito de reclamar pelos danos causados

No momento em que o paciente sofrer as consequências, passa a ser ele o primeiro titular para reclamar a indenização pelo uso de prótese com defeito. 

Contudo, esse direito se estende à familiares (cônjuge, pais, filhos etc.) quando ocorrer, por exemplo, o óbito do paciente.

Por certo neste caso, também os terceiros interessados supra referidos, receberão os benefícios da aplicação do Código de Defesa do Consumidor,

São chamado de “by standard”. 

Prazo para reclamar – responsabilidade por próteses de má qualidade

O prazo para reclamar providências de natureza indenizatória cível decorrentes de danos causados pelo uso de prótese ou implante de má qualidade, varia de acordo com cada situação.

Vale aqui a chamada teoria da ciência inequívoca. 

É que existem próteses que tem prazo de validade, enquanto outras não tem. 

As proteses mamária, por exemplo, tem sempre prazo de validade que geralmente são de 10 anos.

No momento em que se constata o defeito na prótese é que se inicia o prazo para postular eventual ação indenizatória civil dos fatos. 

Já em matéria penal a questão é mais controversa e não está absolutamente pacificada na doutrina e na jurisprudência. 

A(s) prova(s) do(s) dano(s) – responsabilidade por próteses de má qualidade

Como referido, o paciente que recebe uma prótese é beneficiado pelo Código de Defesa do Consumidor.

Como visto, por ser o destinatário final do que não deixa de ser um produto ou serviço. 

Assim, nesta condição, poderá se eximir do ônus de provar o defeito. 

É a chamada inversão do ônus da prova.

Assim, basta provar que houve uma relação de consumo (uso da prótese),.

E que esta apresentou um dano e que este dano possa guardar nexo de causa e efeito com o defeito da prótese. 

Ou seja, invertido o ônus da prova, passa a ser responsabilidade do fornecedor (ou de qualquer integrante da cadeia de fornecimento) o dever de demonstrar a inexistência do defeito.

Só que em caso de dúvida(s) essa(s) sempre virá(ão) em benefício do paciente. 

Seja como for, quando estiver na condição de paciente, use seu prontuário médico ou odontológico.

Peça a documentação ao profissional ou ao serviço de saúde no qual foi atendido.

Faça um requerimento por escrito se for preciso. 

Consentimento informado

Por fim, muitas vezes as próteses ou implantes que têm validade.

Ou mesmo algumas espécies de próteses ou implantes, causam problemas sem que isso caracterize um defeito de fabricação. 

O uso de próteses ou implantes podem gerar efeitos não desejados, como rejeição, infecção ou mesmo falta de adaptação.

Para se proteger destes problemas, se você é o médico, dentista e/ou o serviço de saúde esclareça previamente ao paciente ou familiar sobre estas possíveis intercorrências e riscos.

Embora sejam possíveis, estas intercorrências e danos são indesejáveis.

Para resolver isso existe um documento escrito.

É o chamado de consentimento informado por meio do qual são materializadas e formalizadas as informações verbais repassadas aos pacientes.

Inclusive sobre os riscos e intercorrências possíveis e prováveis como por exemplo a rejeição não desejada, mais provável e sempre possível.

O paciente e/ou familiar deve ler, entender e assinar esse documento. 

A não adoção deste consentimento informado pelo médico, dentista ou serviço de saúde, por si só já poderá caracterizar uma negligência, passível de ser indenizada.

Mas isso já é assunto para outro post. 

Luiz Carlos Nemetz
Advogado (OAB/SC 4.595)
lcnemetz@nkadvocacia.com.br

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